segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

A necessidade da crítica


Escrita no “calor da hora”, reação imediata diante da obra. Toda crítica é contemporânea, surge do face-a-face com presente do trabalho de arte. Daí o aspecto fundamental: a imediatez e frescor da experiência. Naquele presente, naquele embate visceral entre expressão e compreensão se estabelece um intervalo lúdico, um jogo aberto que envolve um sem número de possibilidades (poéticas, simbólicas, técnicas, políticas, científicas, etc), sem hierarquias marcadas, que por alguma razão começam a formar enlaces precários, conexões instáveis, tramas provisórias, mas que nos mobiliza, agita, vivifica e faz ir a diante, ao novo encontro na expectativa de que tais relações se confirmem para que possamos ter  alguma sensação de compreensão. Como não há garantias prévias, é sempre um renovado encontro o que sucede. Mas é aí que se encontra a graça da crítica.
No entanto, e eis o grande problema, nenhum ato crítico se consolida se não for capaz de ir além da experiência pessoal do sujeito com a obra. Se não seguir adiante, esse momento de contato intenso com a arte, um belo momento sem dúvida, fica limitado a um episódio da “minha vida privada”, do qual não consigo falar sobre, comunica-lo, transmiti-lo a outro e assim compartilhar minha experiência.
A crítica, nesse sentido, é um ato de comunicação de certa experiência, e somente encontra validade na dimensão social da vida. Portanto, não nos deixemos cair nessas fáceis e ingênuas recusas da crítica, acusada de ser mais o resultado de uma frustração, vaidade ou rancor do crítico. Nessa recusa, o que se revela realmente é a obstrução ao debate, ao diálogo, ao reconhecimento de que a arte é um fato cultural público que quanto mais for discutido, mais seu valor se afirma.
O crítico não é uma espécie de juiz, que profere um veredito de autoridade sobre a qualidade da obra. Ele sabe que impor determinada posição ou alinhamento que oriente seu juízo é cercear sua liberdade. Mas se ele compreende que o próprio da obra é manter-se aberta a novos juízos,  não pode ter a arrogância de impor-lhe um juízo definitivo. Um dos maiores, Clement Greemberg, afirmou que a verdadeira liberdade é, inclusive, assentir em ter nossas expectativas contrariadas, e surpreendidos com essa contrariedade, deixa-la fluir livremente. O crítico pode ter suas preferências, é claro, mas não pode querer controlar suas reações.
Em princípio, duas coisas são imprescindíveis à escrita crítica. A primeira é a autenticidade da experiência estética. O crítico é nesse sentido, um especialista na avaliação reflexiva de sua experiência. Quanto mais oportunidades e ocasiões de experimentar a arte, mais riqueza e clareza de material ele invocará no momento do embate crítico. Daí se dizer que um crítico não se constitui sem o contato com a obra, não dá para fazer crítica no conforto de quatro paredes, olhando apenas imagens indiretas provenientes das técnicas de reprodução industrial. A segunda é um elemento mediador entre a experiência da obra e o outro. Um que possa ser comum, que não seria outro que não a linguagem. A escrita crítica, por isso, é um gênero difícil, situado entre o literário e a tradução, entre a sensibilidade e compreensibilidade, na transição entre linguagens distintas. A palavra exata é o seu ideal, mesmo sabendo que ela nunca será suficiente, nunca esgotará completamente a sensação vivida.
Todos sabemos, a linguagem do crítico não é a linguagem da obra, mas da arte se pode falar, e quanto melhor falar e escrever, maior será a chance prolongar o nosso contato com ela.

Um comentário:

  1. MUITO BOM SEU TEXTO, MASAO! Parabéns pela iniciativa! Gostei da página também , cheia de nuvens... Fernanda Junqueira.

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